UM PROJETO

FOTOGRAFIA POR MARCELO LÉLIS
TEXTO DANIEL NARDIN

MUITO ALÉM DOS NÚMEROS: QUALIDADE DO ATENDIMENTO DEVE SER PRIORIZADA

O aumento nos percentuais de atendimento em consultas pré-natais, assim como outros números, são pré-requisitos para mais investimentos e ajudam na avaliação da oferta e acesso do serviço. Porém, conforme destaca Mariana Luz, presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV), além dos dados tabulados, é preciso um olhar atento para a qualidade do atendimento e maior integração entre diferentes serviços.

 Foto: Divulgação/FMCSV

 Mariana Luz, presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

 

A fundação atua no Brasil com foco na Primeira Infância e busca sensibilizar empresas e gestores públicos sobre a importância desse tema, inclusive combatendo desigualdades regionais. “Infelizmente existe uma relação direta desses indicadores, não só no campo do pré-natal, mas também com outros, para crianças e mulheres vulnerabilizadas, que têm cor e tem região. Por isso a gente defende tanto políticas integradas para a Primeira Infância de modo geral”, afirma.

Segundo ela, a qualidade envolve atendimento multiprofissional e com possibilidade de uso de equipamentos tecnológicos. “A medicina avança muito rápido e aí mostra a desigualdade: todo esse avanço não está chegando aos mais vulnerabilizados”, comenta. 

Por isso, a presidente da FMCSV reforça que os números devem ser acompanhados de uma forte atenção em várias frentes. “Claro que a quantidade de consultas é importante. Agora, é na qualidade do serviço que vai evitar os maus indicadores. O que está comprovado é que o pré-natal com sete consultas, o acompanhamento médico, odontológico, emocional, ele tem benefícios importantíssimos para a saúde e diminui mortalidade infantil de causas evitáveis, que acontece no primeiro ano de vida, diminui a mortalidade materna e ele gera vínculo entre mãe, pai, os adultos envolvidos e a criança. E essa possibilidade de um início de uma relação de vínculo desde o nascer da criança que permite o desenvolvimento pleno nessas dimensões que a gente defende”, comenta Mariana. 

Para ela, o indicador quantitativo e da qualidade do pré-natal pode melhorar conforme haja um esforço por maior articulação entre diferentes entes. “Esse dado é fundamental, é mensurável e foi foco de melhoria por todo o sistema de saúde brasileiro. Mas é evidente que precisa de um esforço pela integração, pela busca ativa, da União, do Estado e do município, no caso de quem está na ponta, para conseguir acessar quem mais precisa, incluindo na política pública a pessoa que vai se beneficiar imensamente mais. E aí estamos falando dessas mães e crianças pretas e pardas, ribeirinhas, indígenas e as que vivem na pobreza", destaca. 

“Então não adianta a gente pensar que vai conseguir ter uma regra nacional que vai dar conta de um país de dimensões continentais como o Brasil, sobretudo numa região tão específica como a Amazônia, que quem não conhece bem não vai entender. Por isso é preciso uma união de forças do Estado, do município, para conseguir adequar essa política pública para a realidade dos diferentes contextos e promover a necessária adaptação cultural. Não adianta quem está em São Paulo, a turma de Brasília, tentar resolver o problema das comunidades ribeirinhas sem entender e conversar com quem está lá e vive o desafio”, argumenta Mariana.

Foto: Marcelo Lélis 

Gestantes recebem cuidado de equipe multidisciplinar, receitas de remédios e suplementos, em boa parte entregues na farmácia da unidade.

 

Um dos agravantes na questão do trabalho com mães em período de gestação é o desconhecimento, que impede que ocorram mais atendimentos, como é o caso de gravidez na adolescência. “Tem que promover mais o conhecimento dos seus direitos ou do que deveria ser. Mas muitas vezes não tem esse apoio ou esse papel de orientador, que vai além da oferta do serviço, mas que traz o conhecimento por meio de campanha de conscientização não só para essa possível beneficiária do serviço, mas também para a comunidade, para que haja esse entendimento de que uma mulher grávida, um bebê, ele é um sujeito de direito", avalia.

A Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal também defende uma abordagem mais ampla, com serviços integrados para a Primeira Infância. “Os serviços ocorrem na saúde, mas também na educação e na assistência social. E isso é importante ainda mais na Primeira Infância, que é até os seis anos, uma fase extraordinária da vida, onde você está formando toda a base do seu desenvolvimento, motor e físico, cognitivo e é a base do desenvolvimento sócio emocional”, aponta. 

“A desigualdade está explícita nesses indicadores todos. O que está comprovado é que um olhar sistêmico também é um caminho de solução uma oferta maior do serviço, mas também a qualidade desse atendimento em todas suas dimensões”, avalia.