O Centro Avançado em Pesquisas Socioecológicas para a Recuperação Ambiental, o Capoeira, iniciou suas atividades no final de abril deste ano e é voltado ao apoio a programas de pesquisa em rede e ações colaborativas entre cientistas, povos e comunidades tradicionais, agricultores familiares e gestores públicos. A iniciativa foi aprovada no edital CNPq/MCTI/FNDCT Nº 19/2024 – Centros Avançados em Áreas Estratégicas para o Desenvolvimento Sustentável da Região Amazônica - Pró-Amazônia.
O nome é uma referência à vegetação que cresce em uma área que foi anteriormente desmatada, chamada de vegetação secundária. O Capoeira, portanto, surge como uma estratégia de recuperação ambiental a partir da colaboração entre a comunidade científica, as comunidades locais e o poder público, e terá, nos próximos três anos, uma agenda de restauração robusta, participativa e de longo alcance.
“Atualmente, há muitos grupos de pesquisa, redes colaborativas e comunidades locais empenhados na recuperação dos ecossistemas amazônicos. A proposta do Capoeira é ir além da produção de ciência de excelência, buscamos também articular e promover uma transformação positiva na região, substituindo a cultura da destruição pela da restauração”, pontua Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental e coordenadora do Centro Avançado.
A Amazônia já perdeu 18% de sua área florestal original por conta do desmatamento, segundo dados do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe). É uma área de cerca de 800 mil quilômetros quadrados, que equivale à soma de todos os estados da Região Sul do Brasil. Além disso, 38% das florestas remanescentes estão com algum grau de degradação causada pela ação humana, como exploração madeireira, incêndios florestais, entre outras, e pelas mudanças climáticas.
“Trata-se de uma resposta aos impactos graves do desmatamento e da degradação florestal, que já comprometeram grande parte da floresta amazônica remanescente”, acrescenta Joice Ferreira. Esses distúrbios geram emissões massivas de gases de efeito estufa, perda de biodiversidade, alteração no regime de chuvas e aumento de doenças e conflitos socioambientais.
Laboratórios vivos
Uma das estratégias de atuação do Capoeira é a criação de laboratórios vivos que serão espaços de troca de experiências e saberes entre os diversos atores da restauração. Esses laboratórios estão localizados em três territórios amazônicos: 1. região de Santarém, no Oeste do Pará, com destaque para a Floresta Nacional (Flona) do Tapajós, a Reserva Extrativista (Resex) Tapajós-Arapiuns e assentamentos rurais; 2. mosaico do Gurupi, região formada por Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas no Pará e Maranhão; e 3. Nordeste Paraense, abrangendo municípios como Bragança, Capitão Poço, Irituia, Paragominas e Tomé-Açu, região de colonização mais antiga do estado.
Esses territórios são considerados importantes espaços de pesquisa e ação devido às intensas transformações socioambientais que ocorreram em suas paisagens ao longo de diferentes períodos, de acordo com os pesquisadores do Centro. “Nesses territórios já existem parcerias de longa duração com as comunidades locais, e serão espaços de escuta e co-construção, com foco em ações de recuperação florestal com abordagem biocultural”, acrescenta a pesquisadora Ima Vieira, do Museu Paraense Emílio Goeldi e integrante do Capoeira.
Restauração para enfrentamento da crise climática
Apesar dos esforços e compromissos assumidos pelo poder público local, nacional e internacional, iniciativa privada e cooperação da sociedade civil, a restauração dos ecossistemas amazônicos é uma questão urgente e precisa ganhar escala, segundo os pesquisadores do Centro.
Para Danielle Celentano, do Instituto Socioambiental (ISA) e integrante do Capoeira, “a restauração de ecossistemas deve garantir diversidade e inclusão, integrando conhecimento tradicional, ciência e tecnologia — só assim construiremos soluções justas e duradouras".
A equipe técnica parte do entendimento de que restaurar a Amazônia é essencial para enfrentar as crises climática e de biodiversidade. As ações, como explicam os pesquisadores, vão além da recomposição florestal: envolvem o restabelecimento de funções ecológicas, conservação da biodiversidade, segurança hídrica e alimentar, além da promoção da justiça socioambiental.
A proposta está alinhada a políticas públicas nacionais e internacionais, como o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) e o Programa Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Proveg), o Acordo de Paris e o Plano de Recuperação da Vegetação Nativa do Estado do Pará (PRVN-PA).
Instituições envolvidas
O Capoeira é coordenado pela Embrapa Amazônia Oriental e tem a colaboração das outras Unidades da Embrapa (Roraima, Agricultura Digital e Recursos Genéticos e Biotecnologia) e das Universidades Federais dos estados do Amapá; Maranhão; Roraima; Acre; Mato Grosso; Rural da Amazônia, do Pará, do Oeste do Pará, e do Sul e Sudeste do Pará; além das instituições: Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade (Ideflor-Bio), Instituto Federal do Mato Grosso (IFMT), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Tecnológico Vale (ITV), Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), e The Nature Conservancy (TNC-parceira).
O Centro avançado conta também com o trabalho de pesquisadores e técnicos do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal do Pernambuco (UFPE) e Mombak - parceira.
A nível internacional, também são instituições colaboradoras o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento (CIRAD) - na França; Universidade Imperial de Londres, Universidade de Lancaster, Universidade Metropolitana de Manchester, Universidade de Oxford - no Reino Unido; e Centro de Pesquisa Climática - nos Estados Unidos.